“A vida não é o que se viveu, mas o que se lembra, e como isso é lembrado para ser contado.”
Gabriel Garcia Márquez
A criação do Clubinho, um grupo de jovens que se reuniam para dançar nas tardes de domingo entre abril e novembro de 1971, foi uma maneira inconsciente e ingênua de celebrar as mudanças de comportamento que ocorreram a partir de meados dos anos 60 do século passado. Santa Vitória oferecia muito pouco (jogatina,” bocas”, futebol). Os ventos que varreram Paris em 1968 chegaram aqui como um sopro, um sopro de liberdade. Ironicamente através da BR471, uma obra do regime militar.
A idade média desse grupo deveria ser de 15 anos. Naquela época quase crianças. O Clubinho foi um rito de passagem, da infância para a adolescência, com todas as virtudes e perigos que isso poderia acarretar. Não esqueçam, vivíamos em uma cidade que ficava longe de tudo, longe do mundo. Antes mesmo de beber a primeira cerveja já era taxado de drogado. Antes mesmo de dar o primeiro beijo era chamado de “bicha”. Os cabelos compridos incomodavam. Namorar era algo natural e necessário. Éramos jovens, alegres, sorridentes. Mesmo assim, mais cedo ou mais tarde alguns iriam morder o fruto proibido. Eu entre eles. O Clubinho acabou por isso mesmo.
Foi algo imperdoável para uma sociedade que recebia com desconfiança os ares de renovação que ocorriam no planeta inteiro. Como disse, era um rito de passagem. Foi nesse ano que tive o primeiro contato com o semanário “O Pasquim”, que mudou minha cabeça radicalmente e, também um jornal, de música, chamado Rolling Stone. Os dois editados no Rio de Janeiro. Isso me transformou. Eu queria ser igual a eles, que gostavam de Jimi Hendrix, mas não abriam mão de ter entre seus discos o último LP do Paulinho da Viola ou do Chico Buarque.
Recentemente comemoramos o reencontro daquele pessoal que dançava nas tardes de domingo. Foi uma festa memorável. As pessoas estavam felizes. Muitos não se viam desde aqueles tempos. É importante não deixar de lembrar que grandes amigos ficaram pela metade deste longo caminho, mas qual geração não passou por isso? Não deixou de ser também uma bandeira branca de Paz oferecida às diferenças do passado, pois várias gerações se fizeram presente no Clube Comercial, como que a dizer: seguimos em frente, desta vez, todos juntos.
Há alguns anos atrás participei de um debate com a jornalista Ana Maria Bahiana sobre o livro “Almanaque dos Anos 70” onde ela fez o seguinte desafio:” quem viveu intensamente os anos 70 está condenado a não se lembrar deles. Pelo menos não intensamente... “ Pois bem, agora aceitei a provocação e o resultado foi lido na noite do dia 26 de novembro de 2011.
Vamos lembrar:
Guerra do Vietnã, Ditadura, Lei de Segurança Nacional, AI-5, Repressão, Censura, Protesto, Transamazônica, Era de Aquarius, Festival de Woodstock, Easy Rider, Jimi Hendrix, Janis Joplin, peça Hair, Hippies, Hare Krishna, Jesus Cristo Superstar, Jovem Guarda, Rock, MPB, Roberto Carlos, Detalhes, Debaixo dos Caracóis do seus Cabelos, Chico Buarque, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Alegria, Alegria, Os Incríveis, The Fevers, Vem me Ajudar, Badabadabada, Ave Maria do Morro, Impossível acreditar que perdi você, Eu quero é botar meu bloco na rua, Último Tango em Paris, Love Story, Beatles, Rolling Stones, John Lennon, O Sonho Acabou, coitado de quem não sonhou, LP, Minicassete, Gradiente, Polivox, Leila Diniz, O Pasquim, Revista POP, só tem amor quem tem amor prá dar, barra limpa, barra pesada, boco moco, estou na Fossa, na minha, na sua, prá frentex, unissex, ele é um pão, gamado, zebra, cuca, careta, curtição, grilo, bicho, é isso aí bicho, podes crer, Macrobiótica, Misticismo, Guru, Dieta, Amar É..., Fliperama, Eram os Deuses Astronautas?, O Despertar do Mágicos, Cem anos de Solidão, Carlos Castañeda, Loteria Esportiva, Sandálias Havaianas, Poster na parede do quarto, Conga, Bamba, Ki-Chute, sandália de sola de pneu, bolsa capanga, japona do Chuí, Patchuli, incenso, Zen, Pelé, Seleção do Tri, Fio Maravilha, Pindorama, Terror Show, Azteca, Fragata, cabeludos, cabelos compridos, Paz & Amor, Amor & Flor, O dedo em “V”, mini-saia, calça boca-de-sino, bata indiana, camisa cacharel, mini-blusa, Blue Jeans, calça Lee, tanga, tanga de crochê, Ginásio, Banda do Ginásio, Baile no Ginásio, Festival da Dona Helena, Penhas no CTG, Baile do 31, Festa de 15 anos, 1ª sessão do Cinema, flertar, pegar da mão, namorar, Reunião Dançante, Bar Tabajara, O Peixeiro, Assobio, The Fingers Sound, Clube Caixeiral, Clube Comercial, CLUBINHO, 40 ANOS, NUNCA FOMOS TÃO FELIZES...
*Paulo Potiguara
P. S. aos incautos e ressentidos: NÃO foi o Nilmar, mas essa, como diria o Charles Gavin, é outra história! Tchau.
domingo, 18 de dezembro de 2011
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Um comentário:
Poti,
como moradora do Chuí, não participei do clubinho, mas muitos(as) de meus (minhas) colegas sim!! além de tudo isso, tinha a paquera na frente do ginásio, as saias de "quatro machos", pregas laterais que não podiam estar mais que 4 dedos acima do joelho, então dávamos muitas voltas no cós da saia para que virase "mini"e pudéssmos mostrar os joelhos e pernas esqueléticos, hehe!!
No Club Social Chuy tínhamos as loterias dançantes organizadas pelo Club Leo, do qual fazia parte, onde tocava o "sal de frutas", banda "da hora" integrada pelo presidente do Leo, Joel Barboza, amigaço!! A sessão dupla de cinema do Cine Lasso, que tinham um pequeno intervalo para troca do filme e todos(as) aproveitavam para uma paquera rápida!!
E, no Chuy, lembro com tristeza da ditadura militar, a qual vivenciei mais diretamente que a brasileira, talvez pela consciencia maior que tinha então... Mercedes Sosa y Horácio Guarani no divino "si se calla el cantor... calla la vida..." dos corpos mutilados da ditadura argentina que "apareciam" nas costas do Uruguay!!
da carencia total do Chuí atrelado a governos municipais que desconsideravam a grande arrecadação da fronteira e as imensas necessidades do povoado!!
da dificuldade de estudar tendo que viajar (à época era uma viagem) todos os dias, da dificuldade de trabalhos em grupo!!
Mas, legal mesmo, é entender que vivemos na adolescencia um dos momentos mais conturbados e mais ricos da História recente!! no final dos "70", já na faculdade, encontros significativos com Simone de Beavoir e a descoberta dos povos ameríndios, sua imensa riqueza cultural!!!
Sou grata a todos(as) que de uma ou outra maneira compartilharam momentos tão espaciais!!
grande abraço!!!!
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